sábado, 7 de novembro de 2009

Ser
Memórias
.

Relembrar é percorrer um
longo caminho, entre o
perfume das flores e a
dor aguda dos espinhos.
Claudijane.B.Guedes


O piar distante de um pássaro noturno anuncia a chegada de mais um dia em Irecê, a cidade parece adormecida alheia, ao cacarejar insistente de um galo que de peito estufado tenta alertar que um novo dia desponta no horizonte.

Um choro de criança se mistura com os sons que o amanhecer traz e uma doce brisa invade o quarto da mais nova mamãe. Ela aconchega a linda menina em seus braços. Aquele bebê era como raio de sol depois de uma longa tempestade, em pensar que tempos atrás ela chorava pelos seus dois filhos que haviam morrido tão precocemente, um por ter uma saúde frágil e a outra por desidratação, doença essa que já tinha levado muitas crianças á morte, deixando uma dor profunda em seu peito.

E agora Deus a havia presenteado mais uma vez com uma linda menina, que traria novamente a alegria para aquele lar. E apesar do grande tumulto que estava acontecendo em todo o país, com pessoas sendo perseguidas, com o custo de vida elevando a cada dia, com os estranhos desaparecimentos de pessoas, que eram contra o governo de Geisel, ela estava feliz com o nascimento da sua mais nova filhinha.

O homem moreno contempla também o rosto da pequena criança e seus pensamentos parecem trilha o mesmo percurso que o da jovem mãe. Fazendo um grande esforço, para espantar as lembranças melancólicas, ele acaricia o rosto do pequeno bebê e diz:” ela vai chamar Claudijane e há de trazer grandes alegrias para o nosso lar”

A noite se foi, e a cidade, se mistura no doce movimento de ir e de vim de pessoas na feirinha das frutas, e na praça do feijão. O cheiro forte do café das casas se misturam com os doces cheiros do amanhecer. Por uma janela aberta se ouve a voz do cantor Chico Buarque, entoando uma canção, que parece descrever a luta diária daquela gente sofrida, e incomodada com a falta de paz que invadia todo o país:

A gente vai levando,
a gente vai levando,
a gente vai levando,
essa chama, mesmo com todo o emblema,
com todo o problema
Todo o sistema, todo o Ipanema
A gente vai levando,
A gente vai levando,
Essa gema, mesmo com o nada feito,
Com a sala escura
Com um nó no peito,
Com a cara dura


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É dolorido olhar a terra, com um aspecto sofrido e fúnebre, as árvores que em outros tempos enchiam a caatinga de rara beleza, parecem vesti-se de luto, como a acompanhar o enterro de um amigo querido.

Ao longe um mandacaru se destaca entre as folhagens seca das árvores. Até o bem te vi parece ter calado o seu canto, diante de tanta tristeza, reina só o silêncio, quebrado apenas pelo o bater das asas do João de barro, que vai e vem entretido na construção de sua mais nova casa, e o mugir desanimado do gado pela falta do alimento, o urubu- rei espia tudo ao redor como a esperar o ultimo respirar, daqueles que vivem em tão sofrida terra

O sol aquece a terra queimando algum broto de feijão, que teimosamente tenta resistir, a longa espera das chuvas.

A falta de chuvas estava atingindo a todos, inclusive o meu pai que dependia do comercio. Devido a essa falta de trabalho, meu pai resolveu que nós iríamos nos mudar para a roça de um dos meus tios, que se localizava em um povoado de Uibai. Em poucos dias, nos mudamos e ficamos encantados com a beleza daquela cidade simples, com características comuns das cidades do interior da Bahia. Nos quintais das casas, o que se destacavam eram os imensos pés de mangas. Ainda posso saborear os cheiros, daquelas frutas, que eram expostas em grandes bacias de alumínio, de forma a chamar a atenção de quem por ali passava. O ar, ainda lembro-me daqueles cheiros de mato, de areia molhada, de alfavacas, da brisa suave e ligeiramente fresca que batia em nossos rostos de meninas.

Lembro-me bem, que no dia que passamos com a mudança, o carro parou logo na praça, e eu fiquei maravilhada com a visão daquela serra, não resistindo fui até lá, e toquei naquela terra, como para me certificar de que aquela imagem era real

Um comentário:

Delian disse...

Gostei muito colega do seu texto,pois o mesmo é composto de inúmeras metáforas,quando fala dos aspectos,a beleza,das frutas,do aconchego das pessoas que alí residem,do cheiro das árvores,das cachoeiras da cidade de Uibaí e muitos outros,no momento que eu ia lendo,lembrei-me do texto de Nina horta que estudamos no ciclo passado.